Entrevista: câncer de mama em questão

Altas taxas de cura se relacionam a diagnósticos precoces. Os índices de incidência estão em queda. Mas ainda é preciso mudar o estilo de vida para proteger-se. O câncer de mama é o mais frequente e mata mais mulheres do que qualquer outro tipo da doença na América Latina, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
No mundo, ele é o segundo tipo mais frequente, correspondendo a 22% dos casos novos a cada ano.
Embora a genética possa ser um fator importante, ela só é relevante em 5% a 10% dos casos.
Nos outros 90% a 95%, as mutações celulares surgem a partir de hábitos e estilo de vida.
Leia a entrevista com Antonio Buzaid, oncologista clínico especializado em câncer de mama, e chefe geral do Centro Avançado de Oncologia do Hospital São José da Beneficência Portuguesa de São Paulo, para saber sobre os avanços nas estratégias de prevenção e tratamento para essa patologia.

Qual é a definição dessa doença?

Antonio Buzaid – É um tipo de câncer que nasce nas células que compõem o tecido mamário. O que é diferente de uma pessoa que tem câncer de pele na região das mamas, mas que não será um câncer de mama.

Como é feito o diagnóstico?

Buzaid – Ele pode ser diagnosticado por meio da palpação, mamografia e biópsia. O diagnóstico precoce é importante porque a probabilidade de cura é muito elevada. O ultrassom é bastante útil para diagnosticar a doença logo no seu início, aumentando as chances de cura. O ideal é que a partir dos 40 anos a mulher faça exames anuais.

Onde há maior incidência?

Buzaid – Nos Estados Unidos: uma em cada oito mulheres é acometida pela doença. No Brasil, estima-se um número próximo a 50 mil por ano. O que define esse número norte-americano é a nutrição, o peso e o estilo de vida.
Isso se comprova ao analisarmos o baixo número de mulheres com câncer de mama no Japão, cuja cultura de vida é mais saudável.

Há perspectivas de crescimento ou diminuição nos próximos anos?

Buzaid – A incidência só aumentou até o ano 2000. Agora está em queda. Isto se deve, em parte, à menor utilização da reposição hormonal com hormonioterapia combinada (estrógeno e progesterona). Ademais, a mortalidade está caindo, graças a diagnósticos feitos precocemente e às inovações nos tratamentos.

Quais são as principais causas?

Buzaid – Os hábitos e estilo de vida podem definir o risco de câncer de mama. Quanto mais a pessoa leva uma vida saudável, menor as chances desse e de outros cânceres. Os hormônios femininos também afetam o risco.
Por exemplo, mulheres que iniciam ciclos menstruais em idade muito jovem, têm menopausa tardia, concebem tardiamente ou nunca tiveram filhos estão sob maior risco.
No passado, a incidência deste câncer esteve associada à reposição hormonal dupla: estrogênio e progesterona.
Juntos, eles mexem com o gene dentro da célula e aumentam a chance de tumor maligno.
Hoje, esse tipo de reposição já não é mais utilizado e usamos somente estrógeno em dose baixa.
Por outro lado, as pílulas anticoncepcionais oferecem mínimo risco, ao contrário do que muita gente pensa, e protegem contra o desenvolvimento do câncer de ovário.
Outro fator que pode causar a doença é a genética, mas ele só corresponde a 5% a 10% dos casos.
Na maioria, a doença está relacionada aos fatores não genéticos, o que rotulamos como ambientais.

Em que idade ele se manifesta?

Buzaid – As chances de desenvolver o câncer aumentam de acordo com a idade. Isto é, quanto mais idosa a paciente, maior o risco.

A alimentação pode influenciar?

Buzaid – Sim, muito. A meu ver, um dos maiores venenos da alimentação são os carboidratos. Ele é, provavelmente, um dos maiores causadores de câncer. Isso porque, quando ingerido, faz que haja o aumento da insulina, evitando que o açúcar do corpo aumente de nível e seu efeito é estimular a célula cancerosa.
O carboidrato é encontrado em pequena quantidade na natureza, mas o homem, principalmente ocidental, inclui este veneno em grande parte da alimentação.
A carne vermelha também é vilã, principalmente quando feita na churrasqueira.
Ela aumenta não só o risco de cânceres, mas também de doenças cardiovasculares.
O ideal é consumi-la o mínimo possível.

De modo geral, incluindo todos os estágios da doença, 75% a 80% dos casos de câncer de mama são curados

Os primeiros sintomas são visíveis?

Buzaid – Sem os exames de prevenção, o mais provável é que ao começar a sentir os sintomas a mulher já esteja com o câncer mais avançado. É fundamental realizar exames preventivos.

E quando a doença já se instalou?

Buzaid – No caso do câncer de mama, se ele está localizado, a paciente notará apenas o nódulo. Nas situações mais graves, a pessoa terá sintomas de acordo com o órgão afetado.

Homens estão livres desse câncer?

Buzaid – Não, mas a incidência é muito pequena quando comparado com as mulheres (cerca de 1 homem para cada 100 a 150 mulheres). Em princípio o tratamento é semelhante, podendo ter pequenas variações de acordo com o caso.

Quais são as terapias mais comuns?

Buzaid – Nas fases iniciais, o tratamento cirúrgico é o mais importante. Com a retirada de parte do seio, a chance de cura é enorme. Quando a mama é preservada, a paciente deve receber radioterapia para o resto da mama de modo preventivo (radioterapia adjuvante).
Após a cirurgia, usamos medicamentos que reduzem o risco de retorno do câncer (tratamento adjuvante sistêmico).
Nos casos em que o câncer tem receptores hormonais, usa-se a hormonioterapia.
Estes receptores são o receptor de estrógeno e de progesterona.
Em casos em que há um maior risco da doença se espalhar pelo corpo, é feita também a quimioterapia preventiva.
Quando a doença já avançou, dependerá das características do tumor e do quanto ele já se espalhou.
Podem ser utilizados anti-hormônios, quimioterapia e terapia alvo, dependendo do tipo.
Em tumores que um gene chamado HER-2 esteja presente, o que corresponde apenas a 20% dos casos, dispomos de muitas opções medicamentosas e algumas estão na iminência de aprovação.
Das drogas já disponíveis no Brasil temos o trastuzumabe e o lapatinibe.
Nos EUA foi aprovado o pertuzumabe, e acredito que logo teremos a aprovação do TDM-1, que tem mínimos efeitos colaterais.
Na área da hormonioterapia, a grande novidade é o uso de uma droga que reverte em parte a resistência à hormonioterapia, chamada everolimo, já usada no tratamento do câncer de rim avançado.

Como são esses efeitos colaterais?

Buzaid – Os mais comuns são calores e dores nas juntas. As quimioterapias reduzem as células brancas, plaquetas, e podem produzir fraqueza, náusea, vômito, diarreia, queda dos cabelos etc. Mas isso dependerá do medicamento usado e da paciente. Cada um reage de um jeito e pode não haver reações.

Quando o seio deve ser retirado?

Buzaid – Nos casos de tumores pequenos é indicada a retirada de parte do seio. Se são maiores, pode ser necessária a retirada total. Há casos em que esse procedimento é indicado de forma preventiva.
Por exemplo, uma paciente que nasce com uma mutação dos genes BRCA1 ou BRCA2 tem aproximadamente 60% de chances de ter câncer de mama ao longo da vida.
Por isso, a cirurgia preventiva pode ser indicada.
Claro que esse método será conversado com a paciente, que pode optar pelos quimiopreventivos – substâncias que reduzem o risco, mas são menos eficazes que a retirada do seio.
Com estas drogas (ou a retirada dos ovários como forma de prevenção) há 50% de redução de risco de desenvolver a doença.
Com a cirurgia, a redução de risco é de cerca de 90%.

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